REFUGIADOS
por Padre Manuel Teixeira
REFUGEES
by Padre Manuel Teixeira
Esta cidade que antes da guerra contava uns cem mil habitantes, viu de repente a sua população engrossar para meio milhão. A de Hong Kong, que era dum cilhão, com a ocupação japonesa desceu para 300 mil. Quem veio?
De Hong Kong vieram 2.500 portugueses, muitos ingleses e quase todas as comunidades estrangeiras ali estabelecidas: italianos, alemães, holandeses, franceses, americanos, irlandeses, etc. Ocuparam os teatros, clubes, escolas vagas, a Ilha Verde e até um navio no Porto Interior. Cada refugiado português recebia do río o Governo $30,00 mensais.
Quando os japoneses invadiram a China do Sul, deu-se o êxodo dos chineses para Macau. Infelizmente, de mistura com gente pacifica, vieram também bandos de piratas, que aqui pretendiam continuar as suas proezas, aterrorrizando a gente com assaltos à mão armada, sobretudo durante a noite. Muitas vitimas custou à Corporação Policial a manutenção da ordem pública.
Vieram ainda milhares de cúlis repugnantes e de mendigos esfomeados que se deitavam à beira dos passeios num estendal de miséria. Muitos chegavam cá agonizantes, morrendo horas depois. Ou¬tros ainda resistiam, mas como a fome apertava cada vez mais, morriam de pura inanição uns cem por dia nas vias públicas. O espectáculo mais repugnante era a exposição de crianças esqueléticas que os mendigos compravam para despertar a compaixão dos transeuntes.
Várias vezes, ao passar por essa pobre gente, tentámos dar lhes um pedaço de pão, mas eles não tinham força para o levar à boca, tal era o seu estado de inanição!
Jaziam esses mendigos ao pé de vitrinas repletas de carne assada, bolos e géneros a rescender odores agradáveis que faziam có cegas à pituitária. Pois eles morriam sem deitarem a mão a nada!
De todas as Comunidades Portuguesas no Extremo Oriente, a que mais sofreu foi a de Xangai, onde viviam milhares dos nossos. Quando os japoneses ocuparam Hong Kong, permitiram que os portugueses se refugiassem em Macau, mas os de Xangai tiveram de lá ficar, pois não haviam barcos que os transportassem para aqui. Durante o longo período da guerra, sofreram as passas do Algarve, passando negras horas de aflitiva miséria. A Macau chegaram os seus brados aflitivos, e, apesar da imensa miséria que aqui reinava, organizaram-se concertos, récitas, rifas e subscrições, sendo enviadas para Xangai avultadas quantias através da Cruz Vermelha Portuguesa.
Macau esteve realmente à altura da sua missão quadrissecular de Cidade de Refúgio.